A distribuição de bombons e flores em comemoração ao Dia da Mulher pode ofender muitas mulheres. Afinal, o 8 de março seria o resultado de uma luta por melhores condições de trabalho.
Em 1911, ocorreu um episódio conhecido como a consagração do Dia da Mulher: em 25 de março, um incêndio teve início na Triangle Shirtwaist Company, em Nova York. A fábrica tinha chão e divisórias de madeira e muitos retalhos de tecido, de forma que o incêndio se alastrou rapidamente. A maioria dos cerca de 600 trabalhadores conseguiu escapar, mas 146 morreram. Entre eles, 125 mulheres, que foram queimadas vivas ou se jogaram das janelas. Mais de 100 mil pessoas participaram do funeral coletivo.
Esse foi mais um acontecimento que fortaleceu a organização feminina.
Na época, nos países desenvolvidos, as fábricas estavam cheias de homens, mulheres e crianças e o movimento operário reagia à exploração desenfreada organizando protestos pelo fim do emprego infantil e por melhoria de remuneração. A igualdade de gênero, porém, nunca era uma reivindicação, apesar de as mulheres não receberem o mesmo salário que os homens e sua renda ser vista como complementar à do marido ou pai. É nesse contexto de manifestação sindical e feminista que surge o Dia Internacional da Mulher. Os Estados Unidos também foram um dos palcos dessa luta, desde meados do século XIX, quando os operários organizavam greves para pressionar os proprietários das indústrias, principalmente as têxteis.
O primeiro Dia da Mulher comemorado nos EUA foi em 3 de maio de 1908, quando “1.500 mulheres aderiram às reivindicações por igualdade econômica e política no dia consagrado à causa das trabalhadoras” (jornal The Socialist Woman). No ano seguinte, a data foi oficializada pelo partido socialista e comemorada em 28 de fevereiro.
De fato, o Dia Internacional da Mulher já havia sido proposto em 1910, um ano antes do incêndio, durante a II Conferência Internacional de Mulheres Socialistas, realizada em Copenhague, Dinamarca. Clara Zetkin, militante e intelectual alemã, apresentou uma resolução para que se criasse uma “jornada especial, uma comemoração anual de mulheres”. A inspiração nas trabalhadoras do outro lado do Atlântico é explícita: para Clara, elas deveriam “seguir o exemplo das companheiras americanas”.
ORIGEM REVOLUCIONÁRIA
Sem data definida, mobilizações anuais pelos direitos das mulheres prosseguiram em meses distintos, em diversos países. Em 8 de março de 1917, uma ação política das operárias russas contra a fome, contra o czar Nicolau II e contra a participação do país na Primeira Guerra Mundial precipitou os acontecimentos que desencadearam na revolução de fevereiro. O líder Leon Trotsky registrou assim esse evento: “Em 23 de fevereiro (8 de março no calendário gregoriano) estavam planejadas ações revolucionárias. Pela manhã, a despeito das diretivas, as operárias têxteis deixaram o trabalho de várias fábricas e enviaram delegadas para solicitarem sustentação da greve. Todas saíram às ruas e a greve foi de massas. Mas não imaginávamos que este ‘dia das mulheres’ viria a inaugurar a revolução”.
Com as duas guerras mundiais que se seguiram, o Dia da Mulher ficou em segundo plano. Foi apenas na década de 60 que o movimento feminista retomou com força as comemorações, em meio a leituras de O Segundo Sexo, de Simone de Beauvoir, e à fogueira de sutiãs nos Estados Unidos.
A LUTA NOS TRÓPICOS
No Brasil, nesse mesmo período, a direita e a esquerda viviam tensões no cenário político e manifestações como a Marcha da Família com Deus e pela Liberdade, com propostas absolutamente opostas às das feministas, que pregavam a legalização do aborto: a Marcha precipitaria o golpe militar de 1964 e dificultou a ascensão das organizações de mulheres.
Mas o Brasil também tinha uma história de luta das mulheres similar à européia e à americana. No início do século XX, as mulheres e crianças constituíam quase 75% dos operários têxteis. Além de péssimas condições de higiene e longas jornadas de trabalho, elas sofriam com o assédio constante de seus patrões e também tentavam se organizar. Em 1906, o jornal anarquista A Terra Livre divulgou um texto de três costureiras que criticavam a não-adesão da categoria à greve operária: “Companheiras! É necessário que nos recusemos a trabalhar também de noite porque isso é vergonhoso e desumano. Como se pode ler um livro quando se vai para o trabalho às 7 da manhã e se volta para casa às 11 da noite?”, dizia. Essas passagens, ligadas principalmente às anarquistas, ainda são pouco conhecidas em nossa trajetória. A vertente que ganhou mais notoriedade no feminismo brasileiro foi a das sufragistas, que lutaram pelo direito a voto. Fundadoras do Partido Republicano Feminino, essas mulheres da elite nacional conseguiram sua reivindicação na Constituição de 1932, promulgada por Getúlio Vargas.
Resultado de todo esse processo, em 1975 comemorou-se o Ano Internacional da Mulher e, em 1977, a ONU (Organização das Nações Unidas) reconheceu o 8 de março como Dia Internacional da Mulher. Fruto de décadas de batalhas e séculos de opressão, a data que lembra a necessária igualdade entre homens e mulheres foi mundialmente – e finalmente – assegurada.
Referências
http://www2.uol.com.br/historiaviva/reportagens/conquistas_na_luta_e_no_luto_imprimir.html
http://www.brasildefato.com.br/node/34242
http://www.cfemea.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=1375:a-mulher-e-o-direito-constitucional-direitos-e-garantias-fundamentais&catid=148:direito-constitucional&Itemid=127