Um ato de criação libertário, exercido dentro de um sistema opressivo, isto é, numa cela de manicômio. Uma obra ao mesmo tempo única e feita de múltiplas partes, que exibe, sem hierarquias, mantos, estandartes, esculturas e objetos comuns, mas ressignificados. Uma representação do mundo para ser apresentada a Deus no Dia do Juízo.”(Fonte: site do Itaú Cultural)
18 de maio: Dia Nacional da Luta Antimanicomial.
18 de maio de 2022: abertura da exposição Bispo do Rosario – Eu vim: aparição, impregnação e impacto, reunindo, no Itaú Cultural, em São Paulo, centenas de trabalhos de Arthur Bispo do Rosario (1911-1989) e estendendo-se às obras de outros artistas, modernos e contemporâneos, que foram impactados pelas obras de Rosario.
Diana Kolker, curadora e pedagoga no Museu Arthur Bispo do Rosario, afirma que a produção do artista sergipano, residente no Rio de Janeiro desde os 14 anos, influenciou profundamente a arte contemporânea; não à toa, sua obra já foi exposta em instituições formais de arte em, ao menos, 150 exposições pelo mundo.
No Rio de Janeiro, Arthur Bispo do Rosario foi empregado pela Marinha brasileira – as referências ao trabalho no mar estão presentes na sua obra – e pela companhia de eletricidade Light, além de atuar como boxeador. Em dezembro de 1938, após ter se apresentado no Mosteiro de São Bento como juiz dos vivos e dos mortos, foi diagnosticado como esquizofrênico-paranoico.
Entre 1940 e 1960, alternou períodos de internação e, em 1964, voltou definitivamente para a Colônia Juliano Moreira, instituição em Jacarepaguá voltada para os loucos e outros excluídos em definitivo. Viveu 50 de seus 80 anos nessas instituições, onde construiu sua obra, desfazendo uniformes dos funcionários, além de lençóis, juntando diversos itens e construindo suas memórias e a representação de acontecimentos da época, colhidos nos jornais.
Na década de 1980, essa atuação – em meio a debates da luta antimanicomial e de questões da arte de então – passou a impactar o pensamento social e artístico brasileiro. Nos anos 80, pela primeira vez, a obra de Bispo foi enxergada fora do contexto do manicômio, em um texto de Samuel Wainer Filho: escrito já na conjuntura da luta antimanicomial, Wainer denunciava o tratamento violento que o Brasil usava contra pacientes psiquiátricos, desde o século 19.
Para mostrar como era o espaço de produção do artista, o museu reproduziu o ambiente da cela de Bispo, espaço tomado por um ajuntamento quase compulsivo de objetos: segundo o artista, sua intenção era fazer um grande inventário das criações da humanidade, a ser apresentado a Deus no Juízo Final. A empreitada era guiada por vozes que só ele ouvia.
Nesses termos, a exibição da arte de Rosário também é vetor do debate sobre a saúde mental e das bandeiras levantadas pela reforma psiquiátrica, como defende a organizadora da mostra, Diana Kolker.
E ela instiga: o melhor caminho é tentar pensar como o próprio Arthur Bispo do Rosario, descosturando uniformes, lençóis, tecidos. “Será que ele não recusou, na verdade, o que se convencionou chamar de arte num pensamento moderno?”, pergunta a organizadora. “Talvez ele tenha pegado esse uniforme do hospital psiquiátrico, puxado os fios, desfeito eles e apresentado essa outra coisa. Ele nos faz pensar então não só no que é a arte, mas no que ela pode ser.”
Serviço
Bispo do Rosario – Eu vim: aparição, impregnação e impacto
Visitação: até 2 de outubro de 2022
• terça a sábado: 11h às 20h
• domingo e feriados: 11h às 19h
Entrada gratuita
Itaú Cultural – Av. Paulista, 149, São Paulo
[livre para todos os públicos]
Referências
https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2022/05/como-bispo-do-rosario-que-passou-50-anos-em-hospicio-mudou-arte-contemporanea.shtml
https://www.itaucultural.org.br/secoes/agenda-cultural/a-arte-e-a-mistica-de-arthur-bispo-do-rosario