O manuscrito Voynich, uma publicação de aproximadamente 600 anos, em formato de bolso e com 240 páginas, é um enigma que intriga estudiosos de várias áreas: especialistas em códigos criptografados, físicos, botânicos, entre outros.
Isso porque está escrito em linguagem indecifrável, e da direita para a esquerda (Leonardo da Vinci já escrevia assim, espelhado, mas em uma língua conhecida). O manuscrito enigmático é repleto de ilustrações botânicas, científicas e figurativas. O que se sabe é que foi comprado por 600 ducados de ouro, pelo imperador Rudolph II da Alemanha, no final do séc. XVI, e depois ficou desaparecido até ser adquirido, em 1912, na Itália, pelo livreiro polonês Wilfrid Voynich. Hoje em dia, encontra-se na Universidade de Yale (EUA).
As 240 páginas do manuscrito são ricamente ilustradas, com imagens de plantas e corpos celestes, o que sugere que se trate de um texto sobre ervas e astrologia, mas seu conteúdo continua um enigma. Algumas folhas têm várias vezes o tamanho do livro, quando desdobradas. A temática dos desenhos é a única pista sobre os assuntos de que trata cada seção: metade do volume retrata plantas inteiras, a maioria não identificada (três delas o foram, mas as espécies ocorrem em várias partes do mundo, não ajudando a localizar sua origem); segue uma seção astrológica, com desenhos do Sol, da Lua, de estrelas, do zodíaco, círculos no céu e muitas mulheres nuas; a seção seguinte contém estranhos desenhos de tubos, que se acredita serem vasos sanguíneos, microscópios ou telescópios, e mais mulheres nuas em piscinas; em seguida, vem a seção chamada de “farmacêutica”, que parece ser uma lista, aparentemente de nomes de folhas e raízes. O livro termina com páginas repletas de um texto formado por uma série de parágrafos curtos, ilustrado apenas por estrelas nas margens.
Uma equipe brasileira formada por pesquisadores que atuam na Alemanha e na Universidade Federal de São Carlos, interior de São Paulo, também acredita que o manuscrito não seja uma sequência de símbolos sem sentido. Desenvolveu um método que usa técnicas da física estatística, para analisar a frequência com que as palavras aparecem ao longo de um texto. Resultados dessa pesquisa foram publicados em julho de 2013 na revista PLoS One. Na verdade, esse método, desenvolvido para estudar o Voynich, tem hoje outras aplicações : “Ele nos permite identificar as palavras-chave de um texto longo, sem que seja necessário conhecer sua organização ou compará-lo com outros textos, tal como fazem mecanismos de busca como o do Google”, explica um dos autores do estudo, o físico Eduardo Altmann, do Instituto Max Planck para Física de Sistemas Complexos, em Dresden, Alemanha.
Fraude ou não?
Especulou-se muito se o manuscrito não seria uma fraude criada pelo próprio Voynich, que adquiriu o manuscrito e depois lucrou com sua venda, mas historiadores e biógrafos já descartaram tal hipótese.
Como se disse, muitas têm sido as tentativas de decifrar o enigma. Junto ao manuscrito, por exemplo, uma carta datada de 1666 e assinada por um acadêmico da cidade de Praga, na atual República Tcheca, pedia a um jesuíta em Roma que tentasse decifrá-lo. Também foi feita, em 2010, uma análise físico-química dos papéis e das tintas e concluiu-se que o manuscrito deve ter sido produzido mesmo entre 1404 e 1438. E muitas pessoas, em distintas partes do planeta, estudam esse documento, tentando achar uma explicação para ele. Com o desenvolvimento da informática, a partir dos anos 1990, uma comunidade formada por uma centena de pesquisadores de várias disciplinas, todos interessados no Voynich, começou a se comunicar pela internet, o que gerou grande expectativa de avanços na pesquisa.
Recentemente, Arthur Tucker, botânico, professor emérito da Delaware State University (EUA), e seu colega Rexford Talbert surpreenderam-se com a similaridade de uma das ilustrações do Voynich com a xiuhamolli/xiuhhamolli ou “planta sabão”, que aparece no Codex Cruz-Badianus, de 1552, também conhecido como Herbário Asteca, escrito por Martín de la Cruz, no México. Por essa similaridade, supõem que o manuscrito possa ter sido feito na América Central.
O estudo feito na Universidade de São Carlos, com os físicos Osvaldo Oliveira Jr. e Luciano da Fontoura Costa, do Instituto de Física de São Carlos, da Universidade de São Paulo, trata os textos como se fossem redes complexas de palavras (ver figura em cima). “Duas palavras são conectadas na rede se elas aparecem vizinhas no texto”, explica Diego Raphael Amâncio, aluno de doutorado de Costa e primeiro autor do artigo da PLoS One. Antes de atacarem o Voynich, os pesquisadores avaliaram 29 tipos de medidas estatísticas que podem ser obtidas a partir da análise de um texto qualquer – elas são quantidades que medem como as palavras aglomeram-se ou se dispersam ao longo do texto ou que medem a distribuição dos vários arranjos possíveis das conexões entre as palavras. As medidas avaliadas pelos brasileiros indicam que o texto do Voynich apresenta mesmo uma estrutura sintática e transmite alguma mensagem.
“O tamanho da literatura sobre o Voynich é assustador e me fez perguntar até que ponto seu objetivo é científico”, conta Altmann. “É por isso que em nosso trabalho tentamos formular as questões de maneira geral, esperando que o estudo tenha outras aplicações.”
Assista ao vídeo que explica o experimento:
http://www.youtube.com/watch?v=wZndOKzxRAg
Referências:
http://revistapesquisa.fapesp.br/2013/08/13/o-codigo-voynich/
http://www.theguardian.com/books/2014/feb/07/new-clue-voynich-manuscript-mystery
http://www.scientificamerican.com/author/gordon-rugg/
Download completo do manuscrito:
https://archive.org/details/TheVoynichManuscript